.

Publicado em 3 de Março de 2022

Compartilhar:

Meta o quê?

Está em pleno curso a temporada das previsões sobre o que vai acontecer com a tecnologia no ano que começa.

Uma dessas previsões fala em metaverso. Tanto se fala que já virou trend topic em várias direções: na direção da pura tecnologia, na direção dos negócios e na direção do comportamento das pessoas. Esse assunto será objeto de análises a serem descritas em três artigos. O primeiro é uma retrospectiva ao estilo “de onde vem tudo isso?”. O segundo é uma análise sobre o que anda acontecendo nos negócios por conta dessa nova onda. E o terceiro é uma observação bem factual de alguns metaversos que já existem, mas você nem nota.            

A palavra é nova: metaverso. Apesar de nova, está na moda. E como tudo que vira moda nesse mundo de comunicação rápida, muita gente usa, mas nem sabe direito o que significa. Só que, em tecnologia, para usar bem é bom saber de onde vem e, pelo menos, como funciona. É disso que vamos falar aqui.

Se você procurar a palavra “metaverso” em Googles e Wikipedias, vai encontrar uma definição assim: “...metaverso é a terminologia utilizada para indicar um tipo de mundo virtual que tenta replicar a realidade através de dispositivos digitais. É um espaço coletivo e virtual compartilhado, constituído pela soma de realidade virtual, realidade aumentada e internet”. Como definição, essa aí parece bem clara, mas o entendimento da sua essência pode ser expandido. Para isso, vamos caminhar um pouco mais na direção dessas outras tecnologias que se apresentam como componentes do metaverso: a realidade virtual, a realidade aumentada e a internet. São estes componentes que atendem à etimologia da palavra. Neta caso, ela remete a alguma coisa que está além do universo. 

Lá atrás, muito antes do aparecimento dos computadores, a realidade do universo — seus objetos tangíveis — era materializada em átomos. A evolução do conhecimento permitiu criar modelos semelhantes à realidade material do universo, quase sempre miniaturizados, mas igualmente construídos com átomos. Mesmo uma usina hidrelétrica, com uma estrutura gigante, tinha a sua barragem reproduzida em escala reduzida. Antes de serem construídos, os navios tinham o seu comportamento testado com uma miniatura do projeto em um tanque de provas. Tanque esse que continha água e ondas, como acontece no mar.

O advento dos computadores permitiu a criação de modelos de simulação dessa realidade do universo feita com átomos. Um tanque de provas passou a ser, agora, reproduzido por uma matriz de números. Os bits começaram a substituir os átomos. Atenção para essa frase porque ela vai ser repetida mais vezes aqui.

Reproduzir a realidade do universo por meio de números tratados dentro de um computador mostrou-se uma atividade muito atraente e muito bem-sucedida. A popularização dos monitores de tela plana permitiu a visualização de todos esses números em imagens que refletiam com precisão cada vez maior a materialidade do universo. Esse processo abriu espaço para mais um neologismo. Importado da palavra inglesa “render”, hoje chamamos de renderização a possibilidade de usar um conjunto de números para formar uma imagem de algum objeto material, mesmo que esse objeto nem exista como uma coisa real. E o tanque de provas onde se testava a miniatura do navio também mudou de nome. Agora se chama TPN — Tanque de Provas Numérico. Água, ondas, marés... tudo que tem no mar renderizado por números. Novamente, os átomos são agora representados por bits.

Metaverso pela primeira vez

A palavra metaverso foi criada por Neal Stephenson e usada pela primeira vez em seu livro “Nevasca” de 1992. Para entender essa palavra, é bom começar entendendo seu criador. Stephenson vem de um ambiente familiar onde a ciência e a tecnologia faziam parte do cotidiano. O pai era professor de Engenharia elétrica, a mãe trabalhava em um laboratório de Bioquímica. O avô paterno era professor de Física e o materno era professor de Bioquímica. Em 1981, graduou-se em Geografia com especialização em Física e, desse coquetel de influências, resultou um futurólogo e escritor um tanto experimentalista, que mistura memética, cultura cyberpunk, mitologia, capitalismo e o que mais vier pela frente. 

O título do seu primeiro livro já dava uma ideia do que viria em seguida. Publicado em 1984, o livro se chama “The Big U” e aborda o ambiente de uma certa “American Megaversity” cercada por tumultos sociais de toda espécie. Mas não disfarça a fusão de palavras-conceito — mega + university — para criar um neologismo, como voltará a acontecer com metaverso. No caso de “megaversity”, o entendimento do prefixo mega é mais simples, pois tudo que é mega é grande. E “versity” é o pedaço da palavra “university” que ao ser colocado ao lago do mega, vira a tal universidade gigante. 

Com o prefixo meta, o entendimento pode passar por outro tipo de elaboração. E, para facilitar a sua vida, vamos recorrer resgatar tudo isto.

Meta é um prefixo que se popularizou no diálogo contemporâneo. Talvez a utilização mais conhecida para este prefixo seja a de metalinguagem. E exatamente por isto, o significado do prefixo acabou se restringindo ao de uma linguagem que descreve a outra, ilustrada no clássico exemplo do filme sobre o cinema. Mas o prefixo tem outros significados. Significa uma mudança, como em metamorfose. Significa algo transcendente, como em metafísica. E sobretudo, significa algo posterior, que vem depois e que vai além. E daí que emana o significado de metaverso, descrevendo algo que é posterior ao universo e, portanto, vem depois e vai além.

Entendendo o que isso quer dizer

Agora você está pronto para compreender o metaverso a partir do entendimento do que essa palavra quer dizer. E da mesma forma que metalinguagem é uma linguagem usada para descrever outra, metaverso é um universo usado para descrever qualquer outro universo. Simples assim! Mas eventualmente bem complexo já que, para entender um metaverso, é preciso primeiro entender o universo que ele representa e descreve. 

Por isso, esse conceito de metaverso criado pelo Stephenson encaixou-se muito bem no mundo dos games. Cada game tem seu próprio universo e a descrição desse universo particular podia ser feita por meio de um metaverso. Com um detalhe dos mais importantes: qualquer um desses universos pode existir em átomos, mas o seu metaverso sempre será construído em bits! Daí sempre que você desconfiar que está diante de um metaverso, é bom se perguntar se isso que você está vendo existe em átomos ou apenas em bits. A resposta vai ser essencial para você entender o que está diante dos seus olhos. 

Nesse instante, solte a sua imaginação e use o que você aprendeu até aqui para construir metaversos descrevendo outros universos que existem ao seu redor. Ajudo com algumas sugestões:

— para animais de estimação, os pets, que tal um “petaverso”?;

— para academias e demais negócios de fitness, podemos ter um “sweatverso”; e

— para um ambiente de jogos e apostas, pode surgir o “betaverso”!

E como tudo isso vai longe, já estamos prontos para seguir ao próximo capítulo, que leva o que foi discutido aqui para o mundo dos negócios. A promessa é revolucionar os negócios com metaversos. Ela vai se realizar? 



848 leituras 252 Curtidas

Sobre o Autor

Leia Também

O Efeito Baunilha

O Efeito Baunilha

O desafio do uso em larga escala de Inteligência Artificial Generativa

848 leituras 252 Curtidas
Compartilhar:
Café com o Presidente
Próximo Evento
25 de Abril de 2024

Café com o Presidente

Uma conversa com o Presidente da I2AI - Onédio S. Seabra Júnior - para falarmos sobre os temas mais quentes de Transformação Digital e Inteligência Artificial, num bate-papo informal com